quarta-feira, 27 de junho de 2012

...é preciso aprender com as limitações.

Vamos combinar, somos péssimos em matéria de satisfação. Nada está bom em tempo algum. Por menor que seja, existe sempre alguma reclamação em nossas conversas. Não conseguimos nos sentir plenos. Um exemplo que deixa isso bem claro no nosso cotidiano são as variações climáticas. Quando chove, reclamamos. Quando faz sol e calor, reclamamos. Quando esfria, reclamamos... No fim das contas gastamos mais tempo reclamando do que aproveitando e reflexionando aquilo de bom que estas variações podem nos trazer no dia-a-dia. Afinal, sem chuva, sol, vento, frio...a vida seria meio complicada.

Reclamadores profissionais, colocamo-nos no papel de senhores da razão. Sentimo-nos capazes de julgar e opinar sobre toda e qualquer situação sempre com o falso ar de donos de si. Mínimas atitudes se transformam em motivo para explosões de insatisfação e enfado. Falta-nos a capacidade de assimilar que as únicas coisas que se regem pelo nosso controle são nosso pensamentos e atitudes. O resto são variáveis. Quando nos perdemos tentando manter todas elas sobre controle, acabamos por complicar a matemática simples da felicidade. E o pior que isso só se faz notar quando algumas variáveis deixam de ser variáveis e se excluem. Daí sentimos falta de nos aborrecer com aquilo que nos aborrecia.



Analisemos, então: se perdemos nosso tempo maldizendo coisas tão corriqueiras, como reagiríamos diante de situações capazes de nos marcar profundamente e alterar nossos caminhos na marra? Resumindo a ideia dessa pergunta: E se tivéssemos que aprender com limitações? Como reagiríamos? A princípio dois caminhos são possíveis; a revolta e a resignação. Geralmente os caminhos se tomam nessa ordem mesmo. Primeiro a explosão diante da novidade restritiva. Depois a aceitação, buscando novos caminhos.

Para ilustrar, imagine uma pessoa que orgulha-se de seu porte atlético. Exibe-se e alimenta-se de elogios e flertes como qualquer um. Como todo ser reclamante, tem seus atritos e reclama de situações da vida, como por exemplo, a impossibilidade de sair de casa por uma mera pancada de chuva. De uma hora para outra, essa pessoa se vê deitada em uma cama, imóvel, sofrendo com dores por todo o corpo, sem a possibilidade de se movimentar. O que seriam a chuva, os atritos, as reclamações diante de uma situação dessa envergadura? Nada. Nesses casos, a maior felicidade seria poder virar-se sozinho no leito e enxergar o rosto dos companheiros, uma vez que a visão já não se faz mais companheira.

Sempre que pudermos, enfrentemos os pequenos obstáculos do cotidiano. Eles não representam nem uma isca do que uma real limitação pode representar. Quando estivermos vacilantes, reclamando de bobagens, pensemos que o caso relatado no parágrafo anterior desse texto foi realmente verídico. E mesmo com todas as limitações, Jerônimo Mendonça viajava o país todo dando palestras, auxiliava na direção de uma instituição de caridade e, na impossibilidade de sair de porta em porta pedindo auxílios para os carentes assistidos, ligava do seu leito para diversas pessoas pedindo o auxílio que conviesse. O codinome "Gigante deitado" não lhe foi dado por acaso. 

domingo, 17 de junho de 2012

...é preciso ouvir.

Falamos muito. Eis um grande vício de muitos de nós. Nos expressamos muito mais do que deveríamos em determinadas situações. Falamos com gestos que exprimem nossa insatisfação e com palavras que se colocam de maneira inadequada a determinado contexto. Logicamente, todos estamos sujeitos a deslizes desse tipo, mas nem por isso devemos encará-los como normais. Identificado o problema, por que não consertar?!

Policiar-se é um bom primeiro passo. Nesse sentido, a melhor opção é dar preferência à audição que à fala. A ideia aqui é muito simples: Quanto menor a exposição, menor a chance do erro. Além de permitir que erremos menos, essa filosofia do "ouvir" permite que aprendamos mais e reflitamos antes de qualquer expressão mal colocada. Enquanto processamos as informações que chegam a nós pela audição, nos perdemos em inúmeros pensamentos que podem esclarecer diversas questões em nossa mente antes que o dardo da palavra mal colocada possa ser lançado.



Todavia a ideia do "ouvir" aqui expressa não se limita ao sentido puro e simples. Ouvir pode ser muito mais do que a simples assimilação de sons; ouvir refere-se ao saber escutar uma ideia, crítica ou comentário de outrem sem melindre ou desinteresse. As palavras de nossos interlocutores podem, claro, às vezes conter  um pouco de veneno devido à inveja, ciúmes ou qualquer outro sentimento pequeno e degradante dessa estirpe. No entanto, muitas das vezes uma crítica consciente ou um puxão de orelhas necessário são endereçados a nossos ouvidos com a melhor das intenções e encontram barreiras criadas por nossa indesejada audição seletiva. Neste sentido, muitas pessoas com problemas auditivos podem saber ouvir muito melhor que outras com ouvidos em perfeitas condições físicas.

Nada melhor para nosso desenvolvimento e crescimento como pessoa do que aprender com os erros e ter humildade para reconhecê-los mesmo quando apontados por outrem. Somos seres que erram e dependem dos erros para o aprendizado. Sendo assim, ouvir mais com o crivo da razão e falar menos, configuram-se como chave para uma vida mais tranquila e honesta consigo mesmo e com os outros.

terça-feira, 5 de junho de 2012

...é preciso raciocinar a fé.

Acreditar é muito simples. Basta um objeto de crença e um conjunto de ideias e vivências que nos conecte a esse objeto de maneira coesa. Esse conceito é o mais simplório que se pode desenvolver sobre a fé. Por isso mesmo, talvez, seja o conceito mais aplicado. As pessoas creem. Pronto. Não existe um raciocínio sobre a crença. A fé surge como uma relação mágica entre o crente e seu objeto de culto.

Existem situações diversas, no entanto, em que somos chamados a testar nossa fé. Via de regra, quando cremos por crer, nos vemos perdidos em situações difíceis. A esperada calmaria que muitas pessoas buscam ao crer em algo contrasta muito com os problemas enfrentados no auge da crença. Dessa forma, o crente que não raciocina sua fé se torna uma pessoa de fé vacilante, um fanático. Quando as coisas ocorrem de acordo com sua vontade, a fé vive no auge e lhe permite tudo. Todavia, quando problemas surgem, o desespero arrebata todo e qualquer estrutura de fé; estrutura esta moldada sem o cimento forte da razão.


Em qualquer campo de nossas vidas (religioso, científico, pessoal, ...) existem aspectos que nos pedem a crença. Por isso tamanha é a importância de se pensar em como crer. Não devemos abandonar pressupostos diante de dificuldades. A busca pelo entendimento sim deve ser elevada, moldando os conceitos que nos levam a crer em algo. Fé não é sinônimo de "atração de bons acontecimentos" ou de "fuga de decepções". Fé pressupõe entendimento e razão como base para o nosso complemento interior.

Nesta última semana, um dos maiores exemplos de fé raciocinada e equilibrada que eu conheci, partiu para uma nova jornada. O Sr. Francisco de Assis, mesmo encontrando-se em fase terminal no leito de um hospital, ensinou a todos que o acompanharam nos últimos meses o que é ter fé. As dores incomodavam mesmo com a administração de morfina. Diante desse quadro porém, ele mantinha seu discurso de crença em uma recuperação breve. Diante das maiores dificuldades de um canceroso, ele manteve-se firme e agradecido a Deus por tudo que lhe ocorria. Um homem de fé exemplar.

Devemos crer. Mas crer de acordo com o crivo de nossa razão. Nossa fé deve ser um castelo construído com  fortes bases para que não seja derrubado diante de qualquer ameaça. A estrutura pode até se abalar, mas o cimento da razão não permite um desabamento completo.